O policiamento ostensivo preventivo e sua formação profissional jurídica
05/abr/2012
A formação em
Segurança Pública constitui hoje, uma necessidade de âmbito nacional. Ela deve
estar baseada no compromisso com a cidadania e a educação para a paz,
articulando-se permanentemente com os avanços científicos e o saber acumulado.
A formação profissional, ou seja, a educação do
profissional da segurança pública é algo tão natural e universal, a qual
pressupõe clara compreensão e cumprimento por parte de todos os gestores
públicos, contudo, nem sempre foi assim, até o ano 2003 as instituições
policiais, mantinham em suas grades curriculares disciplinas diversas atingindo
uma média de 220 horas/aulas até 1.160 horas/aulas, distribuídas em média em 30
(trinta) disciplinas.
O Ministério da Justiça, através da Secretaria
Nacional de Segurança Pública (SENASP), percebendo esta discrepância entre uma
e outra formação, bem como, a desproporcionalidade de conteúdo prático e
teórico, no ano de 2003 durante o Seminário Nacional sobre Segurança Pública,
apresentou a primeira versão do trabalho intitulado“Matriz Curricular
Nacional”, propondo que o mesmo viesse a servir como um referencial“teórico-metodológico
para orientar as Ações Formativas dos Profissionais da Área de Segurança
Pública – Polícia Militar, Polícia Civil e Bombeiros Militares – independentemente
da instituição, nível ou modalidade de ensino que se espera atender” (Matriz Curricular Nacional –MJ/SENASP).[1]
Proposta esta que foi aceita e implementada por
todas as Instituições voltadas a formação do profissional da área da segurança pública,
assim, dado a complexidade do assunto e a divergência entre o prático e o
teórico, tivemos em 2005 a sua primeira revisão, quando foram agregados ao
trabalho realizado pela SENASP, as Diretrizes Pedagógicas para as Atividades
Formativas dos Profissionais da Área de Segurança Pública.
No período de 2005 a 2007, a Senasp, em parceria
com o Comitê Internacional da Cruz Vermelha, realizou seis seminários
regionais, denominados Matriz Curricular em Movimento, destinados à equipe
técnica e aos docentes das academias e centros de formação.
Esses seminários possibilitaram a apresentação dos
fundamentos didático-metodológicos presentes na Matriz, a discussão sobre as
disciplinas da Malha Curricular e a transversalidade dos Direitos Humanos, bem
como reflexões sobre a prática pedagógica e sobre o papel intencional do
planejamento e execução das Ações Formativas[2].
Os resultados obtidos nos seminários e a crescente
demanda dos Estados com o intuito de se implantar a Matriz Curricular
estimularam o governo federal, através da SENASP, a lançar uma versão
atualizada e ampliada da Matriz, agora contendo em um só documento as
orientações que servem de referência para as Ações Formativas dos Profissionais
da Área de Segurança Pública, tendo como objetivo é garantir a unidade de
pensamento e ação dos profissionais da área de Segurança Pública.
O investimento e o desenvolvimento de ações
formativas são necessários e fundamentais para qualificação e aprimoramento dos
resultados das instituições que compõem o Sistema de Segurança Pública frente
aos desafios e demandas da sociedade.[3]
Atualmente, as 27 (vinte e sete) Unidades da
Federação utilizam a Matriz Curricular como referencial pedagógico, para a
formação, aperfeiçoamento e qualificação do quadro funcional.
Amaral preleciona que: “O policial é um profissional do Direito, tanto quanto o juiz, o
advogado, o promotor de justiça, jamais um profissional da guerra. O policial
não deve ter quartel porque não há de esperar para entrar em ação, ele deve
estar permanentemente bem distribuído”[4].
Do Policial Ferroviário Federal
A Polícia Ferroviária Federal é a polícia
especializada mais antiga no Brasil, foi criada no ano de 1852 e não apenas
recepcionada pela Constituição Federal de 1988, mas sim, mantida como um órgão
de segurança pública, vejamos:
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado,
direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem
pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes
órgãos:
[...]
III - polícia ferroviária federal;
[...]
§ 3º A polícia ferroviária federal, órgão
permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira,
destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das ferrovias
federais.[5]
O Brasil dispõe de apenas 28.168 km de malha
ferroviária em 1998. Cerca de 35% de nossas ferrovias operam há mais de 60
anos. A falta de investimentos e a baixa demanda por vagões e locomotivas,
fazem com que a indústria ferroviária esteja com sua produção praticamente
parada desde 1991.
Em igual proporção a Polícia Ferroviária Federal,
que tem como missão institucional zelar por todos os aspectos relacionados às
ferrovias brasileiras, incluindo a fiscalização e prevenção de acidentes nos 28
mil quilômetros de malha ferroviária.
A sua carreira funcional por falta de
regulamentação e incentivo do governo federal quase chegou à extinção, tendo
sido realizado o último concurso público para o ingresso na carreira no ano de
1989. Resultando com isso, em um quadro de servidores estagnado, pois os
antigos policiais ferroviários federais acabaram sendo demitidos, aposentados e
ou emprestados a outras instituições (especialmente as de gerência e controle
dos trens urbanos).
Estimasse hoje que o quadro destes servidores gere
em torno de mais ou menos oitocentos policiais ferroviários no Brasil, com o
mínimo de tempo de serviço de 20 anos, ou seja, grande parte do seu quadro
funcional esta próximo da aposentadoria.[6]
Com isso a fiscalização e prevenção de acidentes
nas ferrovias que deveria ser função destes profissionais, acabam na prática,
sendo realizada por outras instituições (incluindo outras policiais) e por
seguranças privados.
Atualmente, com a promulgação da Lei 12.462/11, a
sua missão institucional foi restabelecida, permitindo assim que esses
profissionais possam voltar a desenvolver suas atividades subordinadas ao
Ministério da Justiça, assim como é feito pela Polícia Federal e a Polícia
Rodoviária Federal, restando tão somente a devida regulamentação da profissão
para que esses policiais exerçam com eficiência e competência, a demanda que a
sociedade exige, vejamos:
Art. 48. A Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003,
passa a vigorar com as seguintes
alterações:
"Art.29.....................................................
.....................
XIV - do Ministério da Justiça: o Conselho Nacional
de Política Criminal e Penitenciária, o Conselho Nacional de Segurança Pública,
o Conselho Federal Gestor do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos, o Conselho
Nacional de Combate à Pirataria e Delitos contra a Propriedade Intelectual, o
Conselho Nacional de Arquivos, o Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas, o
Departamento de Polícia Federal, o Departamento de Polícia Rodoviária Federal,
o Departamento de Polícia Ferroviária
Federal, a Defensoria Pública da União, o Arquivo Nacional e até 6 (seis)
Secretarias;(Grifo do Autor)
................................................................
§ 8º
“Os profissionais da Segurança Pública
Ferroviária oriundos do grupo Rede, Rede
Ferroviária Federal (RFFSA), da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) e
da Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre (Trensurb) que estavam em exercício
em 11 de dezembro de 1990, passam a integrar o Departamento de Polícia
Ferroviária Federal do Ministério da Justiça."[7] (Grifo do Autor)
Diante do exposto, não podemos falar muito sobre o
treinamento, aprimoramento e formação destes profissionais no período
compreendido entre 1991 a 2011.
Resta claro que com a entrada em vigor da Lei
n.12.462/11, e o retorno da Polícia Ferroviária Federal ao Ministério da
Justiça, tratamento semelhante dado aos policiais federais e policiais
rodoviários federais, será dispensado a estes honrosos profissionais que
fizeram a história do Brasil, nestes últimos dois séculos.
Do Policial Rodoviário Federal
Inicialmente criada com a denominação Polícia de Estradas, em 24 de julho de 1928, a Polícia
Rodoviária Federal, no ano de 1935, foi criado o primeiro quadro de policiais
denominados a época, "Inspetores de Tráfego".
Com a Constituição de 1988, assim como a Polícia
Ferroviária Federal, a Polícia Rodoviária Federal foi integrada ao Sistema
Nacional de Segurança Pública, recebendo como missão exercer o patrulhamento
ostensivo das rodovias federais.
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado,
direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem
pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes
órgãos:
[...]
II - polícia rodoviária federal;
[...]
§ 2º A polícia rodoviária federal, órgão
permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira,
destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das rodovias
federais.[8]
Desde 1991, a Polícia Rodoviária Federal integra a
estrutura organizacional do Ministério da Justiça, como Departamento de Polícia
Rodoviária Federal.
A base da atuação da Polícia Rodoviária Federal é o
trânsito, onde tudo começa. Ao longo dos 61 mil quilômetros de malha federal, a
PRF fiscaliza o cumprimento do CTB, previne e reprime os abusos, como excesso
de velocidade e embriaguez ao volante, e presta atendimento às vítimas de
acidentes.
A PRF também colabora com a segurança pública,
prevenindo e reprimindo o tráfico de armas e de drogas, assalto a ônibus e
roubo de cargas, furto e roubo de veículos, tráfico de seres humanos,
exploração sexual de menores, trabalho escravo, contrabando, descaminho e
pirataria e crimes conta o meio ambiente[9].
Diante do fato de estar diretamente vinculada a
Secretaria Nacional de Segurança Pública, gestora da Matriz Curricular,
dispensamos comentários a respeito da formação, aperfeiçoamento e capacitação
destes profissionais, os quais assemelhassem às atenções dispensadas a formação
do policial federal.
Do Policial Militar
A estrutura hierárquica das Instituições Policiais
Militares brasileiras está organizada de forma seqüencial, onde encontramos os
círculos de oficiais e dos praças.
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado,
direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem
pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes
órgãos:
[...]
V - polícias militares e corpos de bombeiros
militares.
[...]
§ 5º - às polícias militares cabem a polícia
ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares,
além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de
defesa civil.[10]
Convém esclarecer que o ingresso na carreira ocorre
em regra por meio de concurso público em ambos os casos, contudo, o oficial
ingressa inicialmente no Curso de Formação de Oficial, após aprovação em
procedimento seletivo paralelo ao exame vestibular realizado pelas
Universidades Federais, por sua vez, os praças mesmo realizando concurso
público para o ingresso na carreira, em virtude do grau de complexidade da sua
função, o nível escolar exigido não corresponde efetivamente a ensino
universitário, motivo pelo qual sua formação profissional assemelhasse ao nível
técnico.
Neste entendimento, percebemos que a formação de
ambos profissionais pertencentes a mesma instituição policial, se realiza de
forma diferenciada, sendo que o oficial conclui o curso de formação de oficial
em média no período compreendido entre três a quatro anos, e por sua vez, o
praça esta pronto para o serviço operacional em média 1.160 horas/aulas, e/ou
pouco mais que 40 (quarenta) semanas de curso de formação.
O que convém ressaltar é que independente de
estarmos falando do curso de formação de praça ou de oficial, em ambas as
formações a preocupação maior esta justamente no ensinamento com maior ênfase
na cultura jurídica, em todas as instruções independente do foco de abordagem
em regra sempre procura se trabalhar o aspecto legal, associado à prática
policial.
Do Guarda Municipal
A Guarda Municipal, instituição que retornou ao
ordenamento jurídico após muitos anos estando distante, principalmente no
período ditatorial em que o país passou.
Após a promulgação da Carta Constitucional de 1988,
de maneira modesta o constituinte inseriu esta faculdade aos municípios, os
quais aos poucos dado as necessidades locais foram criando, re-criando e/ou
transformando os seus serviços municipais de vigilância em Guardas Municipais,
vejamos:
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado,
direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem
pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes
órgãos:
[...]
§ 8º - Os Municípios poderão constituir guardas
municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme
dispuser a lei.[11]
Visando dar uma resposta mais positiva aos anseios
da sociedade, em abril de 2002, o Governo Federal através do Instituto
Cidadania apresentou aos órgãos de segurança pública o Projeto Segurança
Pública para o Brasil, podendo se afirmar que este é o marco divisor entre o
antigo modo de se fazer segurança pública, e a evolução do policiamento
moderno, qual seja, o policiamento cidadão.
Este projeto foi fruto de trabalho de quinze meses,
interagindo entre pesquisadores, estudiosos, especialistas em segurança pública
e membros dos Três Poderes, entre outros representantes da sociedade.
Um dos pontos de suma importância para os
municípios foi justamente em relação as Guardas Municipais, uma vez que,
segundo a edição do Plano Nacional de Segurança Pública em vigor desde junho de
2000, as atribuições do município frente a segurança pública tomaram uma
envergadura maior trazendo mais responsabilidade e atribuições para o poder
local, assim, o novo projeto apresentou dentre uma das propostas a de
reestruturar e redirecionar a atuação das Guardas Municipais, vejamos:
“Reformular as Guardas Municipais, preparando-as
para que se tornem agências de novo tipo, capazes de combinar eficiência e
respeito aos direitos humanos, gestoras da segurança pública local e operadoras
interativas, mediadoras de conflitos, preventivas da violência e da
criminalidade”.[12]
Com a edição da Matriz Curricular em 2003, assim
como a polícia ferroviária foi deixada de lado, a guarda municipal também teve
este infortúnio.
Com o intuito de corrigir este relapso, em 2005 foi
criada a Matriz Curricular Nacional para Formação das Guardas Municipais
desenvolvida pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP), tendo como
objetivo enfatizar a atuação das Guardas Municipais na prevenção da violência e
criminalidade, destacando o papel dos municípios no Sistema Único de Segurança
Pública (SUSP).
Segundo a Matriz Curricular o Guarda Municipal deve
compreender o exercício de sua atividade como prática da cidadania,
motivando-se a adotar no dia a dia, atitudes de justiça entre outros.
Por fim, estabelecem diretrizes e princípios que
devem nortear a atuação das Guardas Municipais existentes nas diversas regiões
do país, respeitando e considerando as especificidades regionais.
Assim, cumprindo os preceitos legais, bem como, a
Matriz Curricular e o Plano Nacional de Segurança Pública, as Guardas
Municipais iniciaram um processo de readequação profissionalizando e
capacitando cada vez mais o seu quadro de servidores.
A formação em Segurança Pública constitui hoje, uma
necessidade de âmbito nacional. Ela deve estar baseada no compromisso com a
cidadania e a educação para a paz, articulando-se permanentemente com os
avanços científicos e o saber.
Referências:
[1] BRASIL, Ministério da Justiça – Secretaria
Nacional de Segurança Pública. Matriz Curricular Nacional – Para Ações
Formativas dos Profissionais da Área de Segurança Pública. Brasília: 2010. p.1
[2] BRASIL, Ministério da Justiça – Secretaria
Nacional de Segurança Pública. Matriz Curricular Nacional – Para Ações
Formativas dos Profissionais da Área de Segurança Pública. Brasília: 2010. p.2
[3] Idem.
[4] AMARAL, Luiz Otavio de Oliveira. Direito e
Segurança Pública – a juridicidade operacional da polícia. Brasília: Consulex,
2003. P 72.
[5] BRASIL, Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988. 45ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p 37.
[6] SINDICATO DOS METROVIÁRIOS DE PERNAMBUCO – PE.
História da polícia ferroviária federal.
Disponível em: <http://www.sindmetrope.org.br/historia>.
Acesso em: 05 nov. 2011
[7] BRASIL. Lei n. 12.462, de 4 de agosto de 2011.
Institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas - RDC; altera a Lei nº
10.683, de 28 de maio de 2003, que dispõe sobre a organização da Presidência da
República e dos Ministérios, a legislação da Agência Nacional de Aviação Civil
(Anac) e a legislação da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária
(Infraero); cria a Secretaria de Aviação Civil, cargos de Ministro de Estado,
cargos em comissão e cargos de Controlador de Tráfego Aéreo; autoriza a
contratação de controladores de tráfego aéreo temporários; altera as Leis nºs
11.182, de 27 de setembro de 2005, 5.862, de 12 de dezembro de 1972, 8.399, de
7 de janeiro de 1992, 11.526, de 4 de outubro de 2007, 11.458, de 19 de março
de 2007, e 12.350, de 20 de dezembro de 2010, e a Medida Provisória nº
2.185-35, de 24 de agosto de 2001; e revoga dispositivos da Lei nº 9.649, de 27
de maio de 1998. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília,
DF, 05 ago. 2011.
[8] BRASIL, Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988. 45ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p 37.
[9] BRASIL. Polícia Rodoviária Federal. Net,
Brasília, Nov. 2011. Seção Conheça a PRF. Disponível em: <
http://www.dprf.gov.br/PortalInternet/conhecaPRF.faces>
Acesso em: 05 nov.2011.
[10] BRASIL, Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988. 45ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p 37.
[11] BRASIL, Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988. 45ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p 37.
[12] INSTITUTO CIDADANIA. Projeto Segurança Pública
para o Brasil. São Paulo, Fundação Djalma Guimarães, 2002.
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