SEMPRE
PREVALECEU A JUSTIÇA
Sr.
Aluísio Aldo da Silva Júnior, Procurador-Chefe da 6ª Região do Trabalho, por 15
minutos.
O
SR. ALUÍSIO ALDO DA SILVA JÚNIOR - Primeiro, quero saudar o ilustre Deputado
João Campos pelo encaminhamento da proposta de realização deste debate. Ao
entrar nesta sala, fui agraciado com um livro de Deus - e acho que Deus é o
acaso.
Nesse
acaso, começamos com uma ação civil pública na Procuradoria do Trabalho, e foi
surpreendente para mim, porque eu desconhecia a existência da Polícia
Ferroviária Federal. Acho que, para todos nós que desconhecíamos isso, tudo é
muito novo, vivíamos dizendo que a Constituição havia criado uma nova Polícia
Rodoviária Federal, e esse tipo de pensamento é que está trazendo angústia e
sofrimento para essas pessoas, que são policiais ferroviários, porque prova
maior de que essa não existe. É a tal prova material.
Pernambucano
que sou, vou fazer uma saudação ao primeiro grito de liberdade do trabalhador,
dado por Zumbi dos Palmares. Nosso Presidente da República atual é outro
pernambucano e abraçou essa causa, que tem certa repercussão de justiça e de
humanidade. Usamos muito a palavra da moda: globalização, mas é preciso dizer
que a primeira globalização que o mundo conheceu foi a dos direitos humanos,
quando uma nação procurou saber como a outra tratava seus cidadãos. Então, o
direito tem de ser, acima de tudo, humano.
Como
o Direito é dialético, o grupo de trabalho instituído - e aí está o objetivo da
minha palavra - concluiu pelo não aproveitamento dos policiais ferroviários
federais existentes. Esta foi a conclusão do grupo de estudo:
"O
aproveitamento dos atuais empregados das empresas públicas na carreira de
policial ferroviária federal sempre esteve presente nas discussões do grupo de
trabalho; apesar disso, não houve consenso nesse sentido, uma vez que há, por
vias transversas, vedação constitucional para o aproveitamento. As disposições
em vigor do texto constitucional claramente impõem a realização concurso
público para investidura em cargos ou emprego público. A alternativa sugerida
para esse aproveitamento é a de proposta de emenda constitucional, a ser
encaminhada ao Congresso Nacional, a exemplo do que ocorreu com o agente
comunitário de saúde etc.".
Portanto,
a seu ver, o grupo de trabalho encontrou 2 óbices constitucionais: primeiro,
ausência de concurso público e, segundo, necessidade de emenda constitucional,
o que traria uma situação bastante difícil ou mataria a luta.
Mas,
para concluirmos, temos de partir para o Direito com a sua fonte primordial,
que não é a lei. A lei regulamenta o fato social. O húmus do Direito é o fato
social. E esse fato social está aqui presente, aliás sempre esteve presente,
embora desconhecido de todos nós. Esta é a situação: ir do fato social para o
Direito.
Inicia-se
a Polícia Ferroviária no dia 30 de abril de 1854, com a criação das malhas
ferroviárias do Brasil. A ferrovia, que liga a Praia da Estrela, no fundo da
Baía da Guanabara, foi criada pelo Decreto Imperial nº 614, que também criou a
Polícia dos Caminhos de Ferro. Essa é a origem da Polícia Ferroviária Federal.
O
Decreto nº 1.930, de 1857, aprovou regulamento para fiscalização da segurança,
conservação e polícia - temos de atentar para a expressão "polícia" -
das estradas de ferro. Segundo seu art. 36, haveria "sempre no escritório
de cada estação um ou mais exemplares do presente Regulamento, de todas as
instruções concernentes ao serviço e polícia de estrada de ferro(...)".
Portanto,
temos de nos concentrar na questão da atividade, do policiamento ostensivo que
esse pessoal faz. Se não tivermos em mente essa situação, não vamos chegar a
nada, porque já existe policial ferroviário federal e atividade de policiamento
ostensivo. Isso é realidade. E essa realidade deve ser regulamentada por lei.
Muito
depois, para se ter uma idéia, o art. 54 desse regulamento chamava de guardas
os policiais ferroviários:
"Art.
54. O guarda que, nesse caso, efetuar uma prisão, conduzirá o preso à estação
mais próxima se a distância e o tempo permitirem, sem prejuízo de outros
deveres do seu cargo. No caso contrário, entregará ao chefe do primeiro comboio
que passar, que deverá conduzir até aquele ponto".
Sr.
Presidente, o importante é que, até o presente momento, foram mantidos os
guardas ferroviários, com os mesmos poderes, os mesmos deveres, as mesmas
funções oriundas do decreto imperial. Todavia, em face de uma política que
todos conhecemos de desestabilização da malha ferroviária, adotada por vários
governos anteriores, os policiais ferroviários sofreram a discriminação de não
serem reconhecidos como tal. Isso é óbvio. Os seus irmãos policiais rodoviários
federais tiveram outra dimensão, porque o Brasil optou pela malha rodoviária.
Essa questão, então, não é só jurídica, é também política.
Em
1922, o Decreto nº 15.673 substituiu o antigo regulamento, criou um outro e
estabeleceu a Polícia de Estrada de Ferro, a mesma coisa em 1945, com Getúlio
Vargas, que criou também a Guarda Civil Ferroviária, vinculada ao Departamento
Federal de Segurança Pública. Chamo a atenção dos senhores para o fato de que
este é o problema: a vinculação desses policiais. O problema todo é esse, não é
outro.
Em
1957, e aqui é que começa a via-crúcis, o Livro de Jó desses policiais
ferroviários, foi criada a Rede Ferroviária Federal S.A. Ora, uma sociedade
anônima com policiais ferroviários federais. Aqui é que começa a questão
estrábica do Direito - desculpem-me, mas o Direito é dialético. Eu creio que o
trabalho foi muito bem-feito, as intenções foram ótimas, mas estou aqui para
debater, levar a minha tese. E, queira Deus, que eu toque o coração e a mente
dos senhores, para obtermos uma reparação de justiça.
Ocorre
aí uma questão esdrúxula: enquanto a malha ferroviária, a malha em si, era
cuidada por uma autarquia, o pessoal ficava vinculado à Rede Ferroviária. E,
entre esse pessoal da Rede Ferroviária, estavam os policiais ferroviários
federais.
O
art. 180 do Regulamento Geral de Transporte para as Estradas de Ferro, de 1963,
dizia que "as empresas mencionadas no art. 1º deste regulamento e suas
dependências devem ser consideradas em relação às autoridades públicas, nas
mesmas condições que as empresas particulares". De acordo com o parágrafo
único desse artigo, essas "empresas, as estradas de ferro e suas
dependências, que estão subordinadas a policiamento próprio especial, não estão
sujeitas à polícia comum."
Ora,
tínhamos uma situação sui generis. Durante mais de 150 anos, os registros
jurídicos dessa atividade policial, hoje desconhecida de todos nós, se
encontraram nas ferrovias do País. Ocorre que veio a Constituição. A Carta
Magna constitucionalizou vários institutos jurídicos, entre os quais a Polícia
Ferroviária Federal. Então, como desconhecíamos essa atividade - eu mesmo,
confesso -, quando a Rede Ferroviária foi extinta, esses funcionários, como
celetistas, foram levados para o Ministério do Transporte, não ficaram
vinculados a nenhuma autarquia. Essa é a situação. Eles foram saindo para
outras empresas que demandavam necessidade. Em Pernambuco, eles ficaram na
Companhia Brasileira de Trens Urbanos - CBTU.
Sr.
Presidente, temos 2 problemas aqui a serem tratados: um político e um jurídico.
O jurídico reside no fato de que o empregador é uma empresa ou uma sociedade de
economia mista, uma entidade privada, o que juridicamente, leve a que pensemos
diferente. Outra situação é a questão do concurso público.
O
ponto de partida é o fato de que esses policiais existem, fazem boletim de
ocorrência, efetuam prisões no metrô. A propósito, quero trazer para os
senhores uma situação trágica, com a qual fico angustiado todos os dias.
Refiro-me à história do policial chamado Wilson da Silva, a quem não entregaram
uma arma para que ele fizesse a patrulha em determinado dia. E quero abrir um
espaço para dizer que todos esses policiais têm colete a prova de bala, arma,
viatura, tudo que qualquer policial tem. Isso é fato. Esse policial foi
patrulhar, e houve um assalto nas imediações da Estação da Mangabeira. E ele,
corajosamente, enfrentou os 2 meliantes, recebeu um saraivada de tiros e hoje
está inválido. E não se reconhece sequer a sua condição de policial ferroviário
federal, porque a CBTU o chama de agente de segurança.
Depois
de toda esta narrativa, quero dizer aos senhores que a questão do concurso
público está superada, porque o inquérito que apuramos na Procuradoria revela
que todo esse pessoal entrou por concurso público, tendo em vista que a Rede
Ferroviária Federal exigia concurso para o seu ingresso. Portanto, esse fato
está superado juridicamente. A meu ver, não se discute mais. E, mais: lembro-me,
e me lembro bem, de um assunto que estávamos discutindo antes do início desta
audiência. No Ministério do Trabalho, os fiscais do trabalho tinham 2 regimes
antes da Constituição: uns eram celetistas e outros, estatutários. Ocorria a
mesma coisa com a Polícia Rodoviária Federal. A Constituição acabou com essa
situação ao determinar que não poderia haver regime celetista na Administração
Direta. O que ocorreu? O art. 243 da Lei nº 8.112 fez com que todo esse pessoal
passasse para a Administração Direta pelo regime estatutário.
Colocar
esse pessoal como integrante da Administração Direta não é problema nenhum. Há
apenas um óbice, uma questão completamente equivocada quanto ao empregador. Se
esses policiais rodoviários federais estivessem vinculados a uma autarquia,
como ocorreu com o policial rodoviário federal, que ficou ligado ao DNER,
ficaria fácil. Como estavam vinculados a uma autarquia, eram celetistas e
concursados, passariam para o regime estatutário.
No
caso deles, como o empregador sempre foi uma empresa privada... E há uma
ilegalidade, porque essa empresa privada jamais poderia ter policiamento
ostensivo. É uma questão sui generis. Temos de enfrentar um problema de erro
material que deságua no jurídico. Eles não passaram para o regime estatutário.
É só esse óbice e mais nenhum. O resto está superado.
Não
se precisa de uma emenda constitucional, a meu ver. Não é o caso dos agentes
comunitários de saúde, uma categoria criada recentemente. Eles não são novos.
Até pela idade que têm, vemos que sempre continuaram fazendo isso. Desde o
início eles fazem parte de uma categoria diferenciada, de acordo com a lei.
Não
se soube trabalhar quando a Rede Ferroviária foi extinta. Não era para eles
terem passado para a CBTU ou para outra empresa qualquer, porque a atividade
social da CBTU não é policiamento ostensivo. Isso é vedado pela Constituição. O
que há de ilegalidade é isso, não é outra coisa.
A
meu ver, o problema começa pela questão social. Quantos policiais ferroviários
federais existem? Faz-se um grupo de trabalho, faz-se um estudo sobre os - abre
aspas - "empregos públicos ilegais" e dá-se o nome de todos que
existem para uma medida provisória. Quando for feita a estrutura da Polícia
Ferroviária Federal, criando os cargos, eles virão também. Até porque teria de
ser colocado um departamento ou uma autarquia - não sei como funciona - no
Ministério da Justiça, ao qual eles ficariam vinculados quando saísse a medida
provisória, e acabariam o sofrimento e a injustiça, que ocorrem há muito tempo.
Então,
uma medida provisória resolve a questão. Neste mundo em que mal falamos com o
nosso vizinho - entramos com ele no elevador e mal lhe damos um bom dia -, é
preciso que as coisas transitem de forma mais humana. E a coisa mais humana que
temos é a lei. Esta Casa, como fonte formal do Direito, teria, nesse caso, de
fazer um grande resgate histórico, um resgate de vidas, um resgate de justiça.
O grupo de trabalho disse que a isonomia não os favorece. Ao contrário, haveria
o resgate da isonomia entre os policiais ferroviários federais e os policiais
rodoviários federais. Inclusive, o próprio grupo de trabalho, quando fez a
minuta do projeto de lei, colocou a Polícia Ferroviária junto com a Polícia
Rodoviária, porque considera essa estrutura administrativa muito consistente.
Então,
é possível, sim... Acho que não há necessidade de medida provisória. Fazendo
isso, Deputado, estamos realmente dando oportunidade de nova vida a essas
pessoas que só se angustiam. Há um passado histórico. O que vejo aqui são
homens de cabelos brancos, são pessoas já antigas , e contra esse fato, contra
essa prova não há argumento.
Que
Deus encaminhe essa solução.
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